O galo não havia cantado quando ouvi a campainha de casa. Olhei o relógio: 6h30. Deve ser engano. Quem seria numa hora dessa, com o sol recém aparecendo?
Quinze minutos depois, toca a campainha de novo. Duas vezes seguidas.
Levantei-me irritado. Espiei pela janela. Era uma senhora junto ao portão da rua. Não tinha jeito de pedinte. Quem poderia ser?Curioso, fui atender.
Abri a porta. Cara de colorado depois do segundo gol do Mazembe e dos pulinhos do goleiro.
Ela percebeu meu humor de gremista chateado com essa novela Ronaldinho.
“Desculpe, mas é que o meu gato caiu do apartamento ontem e agora está aí no seu pátio…”
Mas não dava pra esperar mais uma hora?, perguntei. “Eu estava dormindo, pô!”
Ela desculpou-se toda chorosa.
Desci e abri o portão. Não conseguiria mais dormir mesmo.
Nos fundos do pátio, tem um puxado onde faço minha cerveja e guardo umas coisas.
Ele foi entrando, dizia:
– Gato, gato. Meu filho, é a mamãe, é a mamãe, meu mimoso.
E nada do gato.
– Vem com a mamãe meu mimosinho, pode vir.
No início, achei engraçado o jeito dela. Mas logo senti o quanto aquele gato significa pra aquela senhora. Fiquei comovido.
Depois, quando ela me disse que era professora do Estado, aposentada, fiquei penalizado.
O gato finalmente apareceu. Saiu detrás da geladeira. Era um baita de um gato preto, com uns fios brancos na cabeça.
Na hora me lembrei do Kabangu.
Minha irritação havia passado. A dona do gato agradeceu. Perguntei qual o time dela. Grêmio. E o nome do gato?
– É Gato, só Gato.
– Posso dar uma sugestão?
– Pode, claro, o sr foi muito tolerante, muito legal.
– Kabangu.
Ela estranhou o nome. Percebi que não é muito chegada ao futebol.
– É que é um nome diferente, tem sonoridade, altivez.
Ela ficou pensativa.
– Olha, diga o nome do gato a um colorado que a sra vai saber por que esse nome
é o mais adequado. Ah, se ele cair de novo, pode voltar. O Kabangu merece
todo nosso carinho, nossa atenção.