Reflexões sem dores

O belo texto abaixo é do botequeiro Mauro Antônio Pandolfi, 53 anos, natural de Erechim. “É, mais um bota amarela. Moro há muito tempo em Santa Catarina. Passei por Lages, Florianópolis e estou em São José. Mas, o Grêmio me acompanha. Está na alma, nas entranhas e no coração”, diz o Pandolfi, sem esclarecer o que é essa história da ‘bota amarela’.

Bem, mais uma grande contribuição para o nosso boteco. Apreciem sem moderação:

André Renato tem 15 anos e está descobrindo o futebol … no playstation.

Foi algumas vezes ao estádio – ver o Figueirense, seu time por influência dos tios -, assistiu algumas partidas do Grêmio, pela tevê, comigo. Mas, o futebol nunca o fascinou. Num sábado, tempo atrás, voltou a jogar. E, me surpreendeu. Não é habilidoso. Porém, sabe se posicionar, tem um bom passe e, para minha alegria, “sabe ler o jogo” – como dizem os modernos comentaristas. André Renato entra eufórico pela casa, pulando, gritando “ganhei! Fui campeão da Libertadores do condomínio. E, com o Grêmio, pai! Ganhei do River do Alberto – é guri argentino, muito amigo do André -, pai! E, sabe que time usei? De tanto escutar você, escalei o Grêmio com Marcelo Grohe, Saimon, Rodolfho, Bressan, Matheus Biteco, Ramiro, Jean Deretti, Guilherme Biteco, Alex Telles, Maxi e Iuri Mamute. Ganhei todos os jogos, pai! Será possível o Grêmio jogar com este time na Libertadores?”, disse, balançando o pequeno troféu rumo ao seu quarto. Larguei o jornal, pensei, sonhei e falei, com os meus botões, “e por que, não?” Bom assunto para o Boteco do Ilgo. Estou preparado para os urros, ranger de dentes, as porradas e o aplauso solitário do Francisco Coelho.

Futebol é um jogo que vai além do gol. É mágico e pragmático. Organizado e cheio de improviso. Desenhado numa prancheta ou num pé fantástico de um craque. Futebol é fascinante. Um jogo arriscado. Tudo pode ser perdido por um gol. Ou, vencido por uma defesa. A vitória pode vir por um chute longo, forte ou despretensioso. Também, num lance arquitetado, ensaiado durante a semana. Futebol é aleatório. O impossível não existe. Há o Cruzeiro, na Série A; a Chapecoense, na B. Tudo planejado, estruturado, seguido com rigor. Há o Flamengo e o Figueirense. Onde o perdido se transforma em vitória. Buscam força, talento, gana num canto da alma e na poesia do jogo. E, tento enquadrar o Grêmio. Não consigo. O Grêmio é uma esfinge. Decifra-me ou te devoro! Sou devorado, em partes, para ser mais dolorido.

Sou um gremista em dúvida com a Libertadores. Não queria disputá-la. Sei que vai repetir a mesma estratégia de todos anos. O dinheiro é sempre curto. Mas, nunca para achar um medalhão disponível, decadente, disposto a ganhar uma megasena parcelada em 12 ou 24 vezes. Queria só o Gaúchão. A hora para inovar, ousar, descobrir talentos. Ou, esquecer as promessas, se forem falsas. Mas, se até o Bom Senso quer exterminá-lo. Sem os regionais, os guris do interior vão descobrir o futebol no playstation ou no sofá da sala. Este é um outro pitaco.

A Libertadores está aí. Não há como fugir. Ficaria com o Renato de técnico. Ele ainda não está pronto. É um técnico em transformação. Renato de hoje é diferente do outro tempo. E, ao contrário dele, gosto de quem não está pronto. Quem está pronto repete os mesmos erros e acertos. Enquanto o aprendiz é mais ávido por novidades e informações. Renato tem um perfil parecido com Espinosa e o Felipão. São agregadores, além de táticos. Não se enganem com o Portaluppi. Ele é um hábil artesão de times. Há um conceito e uma ideia em campo. Não acompanho treinos. Porém, fica claro o dedo do treinador. Vários jogos foram decididos assim. Arrogante? Soberbo? Não sou psicólogo, mas acho que é uma defesa de guri vindo do interior para vencer na capital. Deu certo! Não vai mudar mais. E, gente, como Renato, talentosa, a arrogância faz parte do charme.

2013 já é saudade. Hora das reflexões sem dores. Não soltei foguetes – nunca solto, é verdade! -, nem gritei ou buzinei por aí. Mas, gostei de ser vice-campeão. É melhor do que ficar se segurando na ponte que quase partiu. E, por falar em partir, chegou a hora de uma turma juntar os trapos, as chuteiras, a dinheirama e procurar outras camisas. Não sei se alguém merece o pé na calçada da fama. O pé na bunda, sim!

Não sou tão juveniilista assim. No lugar de toda medalhada, apostaria em um só: Diego Tardelli. Fez um ano maravilhoso. Tornou-se um hábil armador, um articulador eficaz e mortal artilheiro. Três em um melhor do que os nossos vários trios de ano inteiro. Acredito em Deretti e Guilherme Biteco. No entanto, tentaria Lucca do Cruzeiro. Ele tem, no mínimo, o nível de Éverton Ribeiro. Lucca é muito talentoso. Gostei muito da temporada de Maylson, Lins e Leandro. São jovens, são ótimos. Porém, imagino a Arena em vaia ao anúncio de seus nomes. Buscaria somente um ex-gremista. Anderson daria um toque de magia, de qualidade ao time. Ele precisa se redescobri e se ser redescoberto.

Tinha desistido do texto. Escrevi semana passada quase todo ele. A brutalidade de Joinville me assustou. Futebol é só um jogo. É a coisa sem importância mais importante da minha vida. Tudo vale mais do que um título e o rebaixamento não é uma escala social ou de vida. É só de um clube num campeonato. A violência do futebol é só um espelho do país. Estamos doidos, loucos, fanáticos e cheios de ódio. É o ódio que vi nos rostos e nos olhos dos ‘torcedores’. O ódio disseminado em larga escala. O ódio no discurso de Marilena Chauí contra a classe média. O mesmo ódio contra o Lula nas redes sociais. O ódio disfarçado em rivalidade estúpida nos jogos de futebol. Não são mais clubes. São tribos em guerra permanente. Pensei em largar o futebol, escondê-lo num canto da alma. Vi o olhar atônito de André Renato diante da televisão. “Ainda bem que não vou aos estádios”, disse ele. Refleti. Se quem gosta de futebol, quem vive futebol, abandoná-lo, ele será entregue, de bandeja, aos bárbaros. Enxuguei as lágrimas, escondi as dores de vergonha e reescrevi o texto. Só mantive o início e o final.

Escutei um grito de gol vindo do quarto do André. É do Mamute! Vou lá conferir o Grêmio que desejo ver. O imaginário do meu Grêmio é melhor do que o Grêmio real. Bom, pelo menos para mim!

Bom Natal e um 2014 vitorioso para nós.

PS: André Renato não é personagem. É o nome do meu filho mais velho. Era para ter Éder, também. Mas, minha mulher é fã do Celso Roth, achou exagero três atacantes. O outro filho chama-se Pedro Antônio. Minha mulher recusou Carlos Miguel. Tem algum Pedro e um Antônio na história do Grêmio?

DEZ MANDAMENTOS

O João Machado enviou a seguinte mensagem, publicada no rabo do post anterior, de autoria do Gustavo Medeiros. Achei tão legal que vale a pena compartilhar. Quem sabe não alegra um pouco aqueles corações mais amargos que já não enxergam direito o lado bom das coisas?

Fiquem com o JM:

“Prometi para mim, só coisas boas para terminar bem o ano.

– GRÊMIO 1º do Ranking da CBF.
– GRÊMIO vice campeão do Brasil em 2013.
– GRÊMIO um ano de Arena única no Rio Grande do Sul.
– GRÊMIO trinta anos CAMPEÃO DO MUNDO primeiro do Rio Grande do Sul
– GRÊMIO único time Gaúcho que quer ser(e será) tri-campeão da America em 2014.
– GRÊMIO único time Gaúcho com ARENA FIFA NOVA no Rio Grande do Sul(Resto é Reforma)
– GRÊMIO único time Gaúcho que 110 anos só cria (o outro só copia)
– GRÊMIO da camiseta tricolor, eleita a A MAIS BONITA CAMISA DE FUTEBOL DO MUNDO.
– GRÊMIO único time Gaúcho com a MAIOR torcida do SUL DO BRASIL.
– GRÊMIO único time Gaúcho eleito com a TORCIDA MAIS FANÁTICA DO BRASIL EM 2013.
Estes são os meus DEZ MANDAMENTOS da felicidade para terminar este ano e iniciar outro muito melhor. Convoco mais mandamentos para nossa felicidade”.